sábado, 27 de setembro de 2025

Como era de fato os neandertais

Como era de fato os neandertais

 

Esqueça a visão clássica dos neandertais isolados em cavernas frias, caçando mamutes em terras áridas e desoladas. Uma pesquisa recente, divulgada na revista Scientific Reports, indica que, cerca de 80 mil anos atrás, nossos parentes extintos desfrutavam do sol e do mar ao longo da costa portuguesa, revelando um estilo de vida muito mais diversificado e astuto do que se imaginava. Essas descobertas, baseadas nas primeiras pegadas de neandertais identificadas no país, oferecem uma perspectiva inovadora e detalhada sobre o dia a dia desses hominídeos, destacando sua adaptação inteligente a ambientes variados. Os achados pintam um quadro vivo de grupos familiares explorando dunas, caçando presas e coletando recursos marinhos, o que desafia estereótipos antigos e enriquece nossa compreensão da evolução humana. 🌊🦶

O estudo descreve essas pegadas como uma autêntica janela para o cotidiano pré-histórico, capturando instantes precisos da vida antiga. "As marcas registram um episódio específico, quase em tempo real, permitindo reconstruir ações como uma caminhada coletiva, uma perseguição intensa, uma fuga rápida ou simplesmente a presença em um local particular", explicam os geólogos Carlos Neto de Carvalho, da Universidade de Lisboa, e Fernando Muñiz, da Universidade de Sevilha. Diferente de ossos ou artefatos, que podem ser deslocados ou abandonados aleatoriamente, essas pegadas indicam exatamente onde os neandertais pisaram e como se locomoviam, adicionando camadas de detalhes sobre suas rotinas sociais e estratégias de sobrevivência em um ecossistema dinâmico e cheio de oportunidades. No Monte Clérigo, por exemplo, foram catalogadas 26 pegadas pertencentes a pelo menos três indivíduos de faixas etárias distintas: um adulto robusto, uma criança em fase de crescimento e um bebê com menos de 2 anos, sugerindo laços familiares fortes e atividades compartilhadas. As trilhas revelam que eles subiam e desciam dunas inclinadas, movendo-se devagar nas subidas para poupar energia e acelerando nas descidas para ganhar velocidade. A proximidade das marcas infantis aponta para a existência de um acampamento próximo, enquanto a sobreposição com pegadas de cervos indica táticas de caça sofisticadas, como armadilhas ou emboscadas planejadas, demonstrando um nível de inteligência coletiva e adaptação ao terreno que vai além do que se esperava. 🏞️🦌

Já na Praia do Telheiro, uma pegada isolada, provavelmente de uma adolescente ou mulher adulta, foi encontrada ao lado de marcas de aves litorâneas, reforçando que a existência neandertal não se restringia ao interior continental, mas incluía uma exploração ativa e estratégica das zonas costeiras, onde o mar oferecia recursos abundantes e variados. Essa conexão com o litoral sugere que eles integravam o ambiente marinho em sua rotina, possivelmente passando temporadas nessas áreas para maximizar a coleta de alimentos e minimizar riscos. A dieta desses hominídeos impressiona pela versatilidade: priorizavam veados, cavalos e lebres como presas terrestres principais, mas complementavam com itens costeiros, como moluscos frescos, caranguejos suculentos e até focas, mostrando uma capacidade notável de adaptação flexível ao que o ecossistema local proporcionava. Essa mistura de caça terrestre e coleta marinha ilustra uma abordagem equilibrada e sustentável, adaptada às estações e à disponibilidade de recursos, o que os tornava sobreviventes eficientes em um mundo em constante mudança. 🍲🐚

Para Carlos Neto de Carvalho, esses vestígios comprovam que os neandertais eram bem mais versáteis e perspicazes do que as narrativas tradicionais sugerem, com habilidades sociais e ambientais avançadas. “As pegadas abrem uma visão única e dinâmica para o comportamento rotineiro: um retrato instantâneo de dezenas de milhares de anos no passado”, ressalta o pesquisador, enfatizando como esses achados humanizam esses ancestrais, revelando famílias unidas, estratégias de caça colaborativas e uma harmonia com a natureza que ecoa até os dias atuais. Essa redescoberta não só reescreve partes da história evolutiva, mas também inspira reflexões sobre nossa própria conexão com o planeta e o legado deixado por esses primos distantes. Fonte: Trajetoriatop #Neandertais #VidaCosteira #PegadasAntigas #DescobertaPortugal #HistoriaEvolutiva #trajetoriatop

 

sexta-feira, 26 de setembro de 2025

A Cronica de Walmir Rosário - Direto de Canavieiras

 

AMIGO DE VERDADE NÃO SE COMPRA

Na Confraria d'O Berimbau Tyrone Perrucho observava 
a satisfação de todos e me abastecia de cerveja na cozinha

Por Walmir Rosário*

De há muito tempo a palavra amigo vem sendo descaracterizada e usada para nomear pessoas que nos batemos no dia a dia, embora não possuímos qualquer requisito de simpatia, confiança, ou quem sequer conhecemos. Às vezes nos referimos a alguém como amigo apenas para fazer uma pergunta e queremos mostrar educação ou alguma intimidade.

Na Canção da América, composta por Fernando Brant e Milton Nascimento, a coisa é mais séria e solenemente expõe: “Amigo é coisa pra se guardar/Debaixo de sete chaves/Dentro do coração...”. No Brasil o vocábulo amigo tem o mesmo poder de um canivete suíço nas mãos de quem se encontra no meio do mato sem cachorro e a usa como em mil e uma utilidades, como se fosse Bombril.

Em nenhum outro país deste mundão de Deus a palavra “amigo” é tão mal utilizada quanto no Brasil, quem sabe para mostrar aos cinco continentes que somos o povo mais bonachão na face da terra. Fora daqui, o brasileiro quebra a cara ao tentar dar um abraço em quem acabou de conhecer e apenas pediu uma simples informação.

Pelos manuais de convivência dos gringos deve ser observado um espaço regulamentar entre as pessoas desconhecidas, embora eu não possa precisar em centímetros. Em Amigo, Alexandre O'Neill destaca: “Mal nos conhecemos/ Inauguramos a palavra amigo!/ Amigo é um sorriso/De boca em boca,/Um olhar bem limpo”.

Existem os que afirmam que alguns amigos são mais que irmãos, pois não nasceram e nem conviveram no mesmo lar, filhos dos mesmos pais, mas que devem não apenas sorrir com a boca quando nos veem, e sim demonstrar com os olhos, quem sabe abrir os braços. Para um conhecido meu, a responsabilidade é tanta, que o amigo tem a mesma obrigação de um padrinho com o afilhado.

Outros, nos quais me incluo, são de opinião que amigos de verdade podem ser adquiridos num bar, desde que tenha a mesma qualidade de sua segunda casa, ou melhor, segundo lar. Os mais exaltados chegam a afirmar, categoricamente, que não se fazem amigos bebendo leite, líquido que não possui nenhuma substância capaz de atrair dois viventes entre a troca de palavras enquanto degustam uma cerveja.

No livro Crônicas de Boteco – um guia sem ordem, de nossa humilde autoria está estampado: “Um bom botequim tem que possuir requisitos essenciais para a volta do boêmio, seja no dia seguinte, no próximo fim de semana, ou quem sabe, muito em breve”.

Como diz a canção de Adelino Moreira tão bem interpretada por Nélson Gonçalves: “Boemia, aqui me tens de regresso/ e suplicando lhe peço a minha nova inscrição/ Voltei, pra rever os amigos que um dia/ Deixei a chorar de alegria/ Me acompanha o meu violão”.

E para reforçar, na mesma canção, até mesmo a mulher amada dispensa com o coração transbordando de amor as aventuras de encontrar os velhos amigos: “Acontece que a mulher que floriu meu caminho/ De ternura, meiguice e carinho/ Sendo a vida do meu coração/ Compreendeu e abraçou-me dizendo a sorrir/ Meu amor você pode partir/ Não esqueça do teu violão/ Vá rever os teus rios, teus montes, cascatas/ Vá cantar em novas serenatas/ E abraçar teus amigos leais”.

Como na música, mesmo sabendo que o boêmio andou distante, os colegas de botequim o acolhem com todo o carinho para matar a saudade do tempo de sumiço. Nada de gente falante a ironizar o afastamento, pois o que interessa mesmo é o retorno do companheiro de mesa, de pé de balcão, para, juntos, beberem novas e infinitas saideiras. Amigos de verdade, amigos do peito, como cantava a Turma do Balão Mágico.

Os amigos não esquecem um do outro. Mesmo que distantes não sossegam enquanto não se encontram. Não falo aqui do amigo de grupos de whatsapp, de conversa decorada, curta. Mas daqueles que Paulo Leminski cita no seu poema Amizade: “Meus amigos/ quando me dão a mão/ sempre deixam/ outra coisa/ presença/ olhar/ lembrança, calor/ meus amigos/ quando me dão deixam/ na minha/ a sua mão”.

De antemão aviso que olhares, sorrisos e gestos são os bens mais preciosos do que presentes materiais, estes esquecidos facilmente. Construí, mantive e mantenho um monte amigos de verdade, por todo o tempo. Alguns somem no caminho, por falta de alguma liga que cimentaria a verdadeira amizade. Coisa do passado. Mas não esqueçam que amigo é um bem muito caro.

Não poderia encerrar sem os gestos simples, consolidadores da amizade e que muitos nem chegam a notar. Um deles, que nos deixou com antecedência, Tyrone Perrucho, chegava ao extremo de observar as feições de todos os amigos da Confraria d’O Berimbau, para, com um simples olhar, descobrir quem por ventura não se sentia bem, satisfeito no momento.

E disso sou testemunha de quando me encontrava na prática do fogão ou churrasqueira, o amigo Tyrone Perrucho chegava sorrateiramente com um copo cheio de cerveja bem gelada e recomendava:

– Aproveite e beba, pois você está se prejudicado, sem beber nesse calorão. Aproveite a farra, pois Deus deixou as boas coisas para todos seus filhos –.

Gesto igual só partindo de um verdadeiro amigo!


Radialista, jornalista e advogado.

quinta-feira, 18 de setembro de 2025

QUANDO O SUCESSO NÃO DETERMINA A LONGEVIDADE

 

QUANDO O SUCESSO NÃO DETERMINA A LONGEVIDADE

O movimentado escritório em Canavieiras já não funciona

 Por Walmir Rosário*

A tradição brasileira não recomenda a longevidade das instituições nacionais, mesmo que tenham uma gama de serviços prestados, devidamente comprovados, a exemplo da vetusta Ceplac. Convenhamos que comemorar 68 anos de existência é um feito um tanto, se ainda dispusesse do vigor de tempos pretéritos, quando exibia suas qualidades na área científica – pesquisa, extensão e ensino –, notadamente da cultura cacaueira.

O peso de anos é visto a olhos nus. Sua sede regional no sul da Bahia ainda ostenta as enormes construções de concreto aparente, um pouco carcomidas, é claro, mas com muitas histórias para contar. Ali está sediado o outrora maior centro de pesquisas de cacau do mundo, repleto de cientistas, pesquisadores de especialidades variadas, extensionistas, educadores, administradores, biólogos, engenheiros florestais, economistas, sociólogos, a elite regional.

A cada ano, em 20 de fevereiro, o aniversário era comemorado com festejos mil para exaltar o cumprimento das metas e o planejamento das próximas. A velha e decadente lavoura se tornou sadia, produtiva e batia seguidamente recordes de produção e produtividade. Neste período, a cacauicultura ganhou novas tecnologias e a região cacaueira da Bahia viveu a transição para o desenvolvimento.

Em cada cidade um escritório local, com engenheiros agrônomos e técnicos agrícolas estimulando e transferindo tecnologia, uma revenda de insumos agrícolas, enfim, toda uma estrutura administrativa. Em determinados pontos estratégicos foram implantadas as Emarcs (Escola Média de Agricultura da Região Cacaueira), além de estações experimentais, que cuidavam do acompanhamento das pesquisas.

Em seguida, o pujante órgão do cacau (como era chamado), assumiu parte do desenvolvimento regional, construindo o porto de Ilhéus, melhorando estradas vicinais, ampliando e implantação energia elétrica, telefonia, construindo escolas. Tornou-se um Estado dentro do Estado, este, o ente federativo, proporcionando uma visível melhoria na qualidade de vida da população como um todo e não apenas dos proprietários e trabalhadores da atividade cacaueira.

Até então a Ceplac – por incrível que pareça – era um órgão do Ministério da Fazenda. Com o passar dos anos e dos governos, a instituição cacaueira foi atrelada ao Ministério da Agricultura e teve que se adequar à nova realidade. Já deixara a condição de um órgão criado para a recomposição de dívidas dos cacauicultores e recuperação da lavoura para gerir apenas a pesquisa, extensão rural e ensino técnico.

Semanas atrás, numa crônica, publiquei a ação de grupos sem-terra que invadiram a Estação Experimental Lemos Maia, em Una, e outras duas (Joaquim Baiana, em Itajuípe, e a do Extremo Sul, em Itabela) já tinham sofrido esse dano. De quando em vez recebo telefonemas e mensagens de ceplaqueanos e pessoas de várias cidades reclamando do abandono do patrimônio da Ceplac.

As mais recentes foram do Escritório Local de Santa Luzia (Bahia) e de Jaru (Rondônia). Num vídeo à disposição na internet, o vereador de Jaru, Chiquinho do Cacau, mostra o prédio abandonado, cheio de lixo e mato, totalmente abandonado. E ele conclama a sociedade para que defenda a instituição, que foi e ainda pode ser muito importante para a economia de Rondônia.

Na publicação o vereador Chiquinho do Cacau, pergunta: “O que queremos para a Ceplac?”. E Ele mesmo cita a grande riqueza gerada pela Ceplac na área de pesquisa e extensão, ressaltando o seu patrimônio humano. “A Ceplac precisa de ajuda para continuar trabalhando, apresentando resultados, mas o que vemos é uma falta de respeito ao produtor rural”, reclama.

Um dos exemplos do abandono dos escritórios locais – fechados por falta de pessoal – podia ser visto em Itabuna. O prédio que abrigava a divisão regional e a extensão local, uma verdadeira obra de arte da arquitetura, ficou abandonado por muitos anos. Agora passa por obras, e pelo que soube, será cedido à Prefeitura de Itabuna. Antes estava sendo ocupado por viciados.

O de Canavieiras, há mais de 10 anos teria o mesmo destino, repassado à Prefeitura. Não sei o motivo dos empecilhos, o certo é que a cessão deu errado. Atendendo ao pedido do prefeito Almir Melo, elaborei um memorial sobre a péssima situação do prédio, relatando a situação com testemunho fotográfico, mas a Superintendência de Patrimônio da União não chegou a concretizar a transferência.

Agora, em setembro deste ano da graça de 2025, o prédio tem outro pretendente. Desta vez o candidato é o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), mas que até agora não recebeu as chaves, apesar de ser, também, uma instituição do governo federal. Quais os empecilhos apresentados não se tem o menor conhecimento. E a situação do prédio se agrava ainda mais.

A realidade é que não existem mais no antigo prédio da Divisão Regional e Escritório Local da Ceplac, em Canavieiras, sequer um engenheiro agrônomo, um técnico em agropecuária, um escriturário para atender aos agricultores. O prédio só não se encontra com as portas fechadas, pois um único remanescente da área operacional aguarda apenas o dia da tão sonhada aposentadoria para entregar as chaves.

Esses prédios se apresentam como fortes candidatos à destruição física pelo envelhecimento e à invasão, devido à atávica imobilidade dos órgãos do governo federal. Como diz o velho e corriqueiro ditado: “Faça por ti que eu te ajudarei”. Antes de pedir Deus na causa é preciso uma forcinha por parte dos órgãos e administradores da União.

*Radialista, jornalista e advogado.

quinta-feira, 11 de setembro de 2025

A Cronica de Walmir Rosário - Direto de Canavieiras

 

O PROCESSO PECOU PELO EXCESSO DE JURIDIQUÊS

Por Walmir Rosário*

Muito se fala sobre o extremo academicismo e o comportamento daqueles que o integram. De forma exagerada, muitos o classificam como um grupo fechado, fora da realidade que o cerca, talvez por seu vocabulário diferenciado, bastante formal, recheado de termos técnicos, e que frequentemente é visto, de forma errônea, como pedantismo, criando ruídos na comunicação.

Cada grupo com sua linguagem falada e escrita: os médicos, conhecidos pelos garranchos postos nas receitas, que muitas das vezes nem os atendentes de farmácias mais experientes conseguem decifrar. Os professores, não são diferentes, com palavras bem ligadas às metodologias, gestões e pedagogia; os engenheiros com os termos técnicos de obras, jargões, siglas e abreviações.

Mas o fato que mais chama a atenção é o juridiquês, com o uso exagerado de linguagem rebuscada, palavras latinas, e termos técnicos que costumam deixar de boca aberta qualquer vivente de outra área. Muitas das vezes dá o desavisado leitor pode morrer acometido por falta de ar ao ler uma petição, recurso, sentença, que só o linguajar do médico pode explicar.

Aos poucos, a linguagem empregada nas peças jurídicas vai se modernizando, com frases e períodos mais objetivos, o que veio a facilitar a compreensão, inclusive dos litigantes, antes atônitos com o linguajar. Algumas pessoas, de forma maldosa, diziam que os advogados, promotores e juízes escreviam com a linguagem empolada apenas para impressionar e mostrar conhecimento.

Acredito que uma das pessoas que contribuíram para essa mudança de chave do disjuntor jurídico tenha sido o juiz de Itabuna, depois escolhido e nomeado Desembargador do Tribunal de Justiça da Bahia. O magistrado, antes rádio técnico e radialista conceituado, subia numa antena para consertar o equipamento com a mesma desenvoltura que prolatava uma sentença.

Ao ser transferido para a Comarca de Itabuna, atuou numa das varas Cíveis e no eleitoral com a mesma presteza e desenvoltura e praticidade que todos os conheciam e admiravam. Era comemorado pelas partes por não deixar os processos dormirem eternamente nas prateleiras e gavetas do cartório, despachando-os e julgando-os o mais rápido possível.

Numa certa feita chegou à Vara da qual era titular uma petição volumosa cheia de papéis apensados, recheando quase na sua totalidade a pasta na qual foi envolvido. Numa fim de tarde, ao finalizar uma audiência, o magistrado recebeu do serventuário os novos processos aos quais teria que examiná-los e dar os despachos correspondentes.

O mais volumoso lhe chamou a atenção e logo na capa observou as partes envolvidas, a matéria jurídica envolvida e os advogados. Um deles famoso, eloquente, considerado um intelectual de grandes conhecimentos e também professor. O juiz separou os processos de acordo com seus métodos de exame, deixando o mais volumoso por último.

Justamente quando pegou o processo em questão para iniciar a leitura, recebeu a visita de algumas pessoas e passou a tratar de temas inerentes a processos que corriam na Vara em que era titular. Lá pelas oito da noite, finalmente pegou o processo e guardou em sua valise, deixando para realizar a análise em casa, com bastante calma.

No dia seguinte devolveu os autos recebidos na tarde anterior ao escrivão da Vara, todos com os devidos despachos para o encaminhamento e publicação das decisões interlocutórias. E entre os processos o tal volumoso. O escrivão meteu mãos à obra e passou a datilografar as providências para juntar aos processos e fazer a publicação.

Qual não foi a surpresa do escrivão ao ver as páginas do processo grampeadas das folhas 02 a 12 (penúltima). Sem entender muito sobre os costumes e comportamentos do magistrado, se dirigiu à sala do juiz e indagou – de forma bastante cuidadosa – sobre as páginas grampeadas, solicitando informações sobre qual procedimento tomar.

Sem dar muita importância ao ato, o magistrado, com voz e gestos moderados, explicou que toda aquelas páginas (no jargão forense, folhas) não contribuíam em nada para a solução do feito. Calmamente, explicou que eram excessos cometidos pelo causídico, pois todo o cerne da questão estava colocado nas páginas livres.

E nomeou: Nelas estão: na pagina 01 e 02, a qualificação das partes (autor e réu), a nomeação do advogado, a causa de pedir (origem da lide e o próprio direito, jurisprudência, etc.), e na página 13, o pedido (desejo do autor). Muito se diz o que mais o magistrado revelou ao escrivão, porém, podemos deduzir que as páginas restantes continham apenas palavras que não primavam pela clareza, objetividade e precisão. Com todo o respeito, é claro.


*Radialista, jornalista e advogado

quarta-feira, 10 de setembro de 2025

A GUERRA DO SEQUEIRO DO ESPINHO – José Pereira da Costa

 

A GUERRA DO SEQUEIRO DO ESPINHO – José Pereira da Costa


A guerra do Sequeiro do Espinho

            Os anos entre 1916 e 1920 foram para esta região quatro anos de fenômenos e grandes acontecimentos, a começar pelo desenvolvimento principalmente na região do Sequeiro do Espinho, onde o Cel. Misael estava comprando fazendas de cacau, emprestando dinheiro a juros sob hipotecas e reconhecimento de débitos. Como tudo indicava que ia de vento em popa, Misael, aproveitando seu prestígio político, criou ali um distrito de Paz de Ilhéus, intitulado Ouro Preto, e foram também as autoridades componentes daquele distrito membros da família Badaró e seus apresentados.

 

            Às folhas tantas, os negócios tomaram sentido diferente: política, despotismo e mortes, em virtude das liquidações daquelas transações hipotecárias quitadas judicialmente, se vendo seus auxiliares em polvorosa para conterem a ira popular, daí aqueles liquidados procurarem justiça, vingança pessoal e até mesmo a intervenção de terceiros, como aconteceu com a intervenção do Cel. Basílio de Oliveira em favor de alguns prejudicados. Estes, com aquelas liquidações, formaram um número tão grande, que o Cel. Basílio precisou facilitar terras de sua Fazenda Corcovado, para o indivíduo começar sua vida, chegando a vez de Francisco Mendes. Chico Mendes se dizendo prejudicado por Sinhô, subdelegado de Ouro Preto, tocalhou-o e feriu-lhe a tiros de repetição. Sinhô, que andava em disparada, conseguiu chegar a Ouro Preto ainda com vida, mandando uma escolta prender Francisco Mendes, vivo ou morto, tendo aquela escolta o encontrado em frente à fazendo do senhor Tomás Barra, embaixo de uma barcaça. Ali Chico Mendes resistiu à prisão, fazendo fogo no grupo, ferindo ainda um dos seus perseguidores, quando acabou sua munição, sendo então baleado, preso e levado amarrado à presença de Sinhô, até a estação da Estrada de Ferro, onde Sinhô se encontrava, aguardando trem especial para lhes conduzir a Ilhéus. Após a chegada daquele transporte especial, Sinhô seguiu levando seu desafeto gravemente ferido, o qual faleceu antes de chegar a Ilhéus, isto em 1º de dezembro de 1917.

 

            Após este fato as coisas pioraram 90%, visto João Mendes ser conhecido de João Vital, que era seu irmão e chefe supremo das Forças Armadas do Cel. Basílio de Oliveira, tendo o mesmo jurado vingar a morte do irmão.

 

            Começou então a luta armada e as funestas consequências inacreditáveis. Certo dia foi invadida a loja do senhor Manuel Inácio, no lugar Vinhático, onde aqueles invasores pertencentes ao grupo de Sinhô Badaró que, além de levar o que quiseram, ainda depredaram aquele estabelecimento comercial, espalhando pelo terreno baldio tudo quanto ali existia, inclusive tecidos, travando-se luta armada.

 

            Sinhô, apesar de ser autoridade policial e estar com a situação política, tinha a minoria armada e também a opinião pública. Daí se registrar diariamente vitórias e mais vitórias para o lado de Afonso Martins, Antônio Olímpio, Brás Damásio e João Vital, generais e chefes das Forças Armadas do Cel. Basílio de Oliveira, quando se aproximou o dia fatal da vitória. Naquele dia, foi lançado todo o poderio de parte a parte. Ao lado do Sinhô estava Miguel Deiró, com 830 homens armados, e do Cel. Basílio 1.300, começando o fogo decisivo no lugar Sequeiro Grande, registrando-se maiores perdas, a todo instante, das forças de Miguel Deiró, quando pela retaguarda deste foi cortado o fornecimento de munição. Deiró levanta bandeira branca, mesmo assim foi preso, e desarmado com seus 360 homens restantes. Colocado sob o mourão de uma cancela, Deiró assistiu ao impiedoso massacre de todos os seus homens. Logo após a chacina, Deiró foi amarrado de cabeça para baixo e aberto em bandas, assistindo, ainda com vida, seu fato cair.

 

            Terminada aquela luta, em fins de 1919, Alberto Lopes, voltando, encontrou suas forças e deu ordens expressas para a captura de Zenique*, vivo ou morto. Perseguido dia e noite, este viajou com destino ignorado, até que Lopes se retirasse da região.

 

---------------------------------------------------------------------------------

*Zenique – era comprador de briga, valentão. Sempre envolvido em desordens.

 

 

(TERRA, SUOR E SANGUE – HISTÓRIA DA REGIÃO CACAUEIRA, Cap. X)

 

José Pereira da Costa

 

segunda-feira, 8 de setembro de 2025

NASCIDA EM ITAJUÍPE, REITORA DA UFSB RECEBE COMENDA 2 DE JULHO

 

NASCIDA EM ITAJUÍPE, REITORA DA UFSB RECEBE COMENDA 2 DE JULHO

 

A reitora da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), Joana Angélica Guimarães da Luz, recebeu, na sexta-feira (5), a Comenda 2 de Julho, maior honraria concedida pela Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA). A homenagem foi proposta pela deputada estadual Ludmilla Fiscina (PV) e reconhece personalidades que se destacam na defesa das liberdades e no desenvolvimento social e político da Bahia e do país.

A cerimônia contou com a presença de reitoras de universidades baianas, representantes do governo estadual, lideranças políticas, familiares e amigos. A sessão foi aberta com a exibição de um vídeo com depoimentos da comunidade acadêmica e de parceiros institucionais. “Estarmos aqui, nós, mulheres, no espaço de poder não é fácil, mas é desafiador e saboroso”, afirmou a deputada Ludmilla, ressaltando a trajetória de Joana na educação.

Emocionada, a reitora destacou o caráter coletivo de sua caminhada, afirmando ter muita honra de compartilhar esse momento, que demonstra que ela não anda só, mas muito bem acompanhada. No discurso, Joana lembrou a mudança de sua família de Itabuna para Salvador, experiência que classificou como um divisor de águas. Quarenta anos depois, retornou à cidade trazendo a UFSB.

“Ouvi muitas vezes palavras de desencorajamento por ter vindo do interior e por ter estudado em uma escola de periferia ou palavras de incentivo, de que eu era muito inteligente e ia ser aprovada. As duas perspectivas me assustavam. A sensação de responsabilidade colocada nos meus ombros me fez ter muitas noites de insônia, com medo de dar razão aos desencorajadores ou falhar com aqueles que acreditam em mim”, relatou.

HISTÓRIA DE VIDA

A trajetória de Joana Angélica é um exemplo de dedicação e superação. Nascida em Itajuípe, mudou-se aos 15 anos para Salvador, onde iniciou sua jornada na educação pública no antigo Ifba (Instituto Federal da Bahia). Sua formação acadêmica inclui graduação em Geologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), mestrado em Geoquímica e Meio Ambiente pela Ufba e um PhD em Engenharia Ambiental e Florestal pela Universidade de Cornell, nos Estados Unidos.

Superando os desafios, foi aprovada na escola técnica e, em seguida, ingressou no ensino superior — conquista que representou a realização de um sonho coletivo de sua família. Para Joana, a educação é a chave de transformação. “Por meio da educação, podemos andar por caminhos nunca antes imaginados”.

Compuseram a mesa a deputada Ludmilla; a reitora Joana Angélica; a professora de Articulação do Ensino Superior da Secretaria de Educação, Tânia Benevides, representando o Governo do Estado; o vereador de Salvador, Felipe Santana; a Líder do Grupo Mulheres do Brasil e representante da família, Isabel Guimarães.

Além da reitora da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), Georgina Gonçalves; a reitora da Universidade do Estado da Bahia (Uneb), Adriana Marmori; a reitora da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), Amali de Angelis Mussi; a Procuradora Federal da UFSB, Roberta Rabelo; e a Defensora Pública Raquel Malta.

O evento teve ainda a participação da deputada Olívia Santana (PC do B), do deputado federal Jorge Solla (PT), do secretário de Ciência e Tecnologia, Marcius Gomes, e da secretária de Promoção da Igualdade Racial e dos Povos e Comunidades Tradicionais da Bahia, Ângela Guimarães.