sexta-feira, 24 de março de 2023

A Cronica Esportiva de Walmir Rosário

 

O ITABUNA BAIXOU, SARAVÔ E INCOMODOU

Itabuna faz festa ao ganhar a série B (foto site Itabuna)

Por Walmir Rosário*

Bastou o “Meu time de fé”, agora chamado de “Dragão do Sul”, se soltar dentro das quatro linhas dos campos baianos para incomodar uma legião de personalidades, chamadas, por engano, de desportistas. Foi pinote pra tudo quanto é lado, principalmente pras bandas de Salvador, pois não gostaram do assanhamento dos meninos vestidos de azul e branco pra cima deles, como se fosse proibido dar um chute na hegemonia soteropolitana.

Em 2022, o Itabuna Esporte Clube volta aos campos baianos, dá uns dribles desconcertantes e se sagra campeão baiano da série B. Até a disputa final foi parar na justiça, como se a vitória mais bonita não fosse em campo, com jogadas alegres, algumas delas convertidas em gol para o delírio da torcida vencedora. Contra tudo e contra (quase) todos, venceu e convenceu.

Relembrando 53 anos passados, a modesta equipe do Itabuna, porém compromissada com o bom futebol, tem o desplante de baixar, saravá, e incomodar, vencendo, seguidamente, os adversários. Foi como mexer num vespeiro. Sem quê nem pra quê, a surpresa dos adversários se transformou em ameaça, não de violência dentro e fora de campo, mas da soberania no futebol baiano.

Entra ano e sai ano, o campeonato baiano é aquela mesmice, com Bahia e Vitória disputando as finais, uma ou outra ganhando, às vezes, por anos seguidos, salvo algumas intromissões de pouquíssimos clubes do interior. Acredito, até, que o culpado foi o próprio time do Itabuna, empolgado com a vitória do campeonato da série B, resolveu “meter o ferro na boneca”, como dizia França Teixeira.

Foi só mexer nos brios dos velhos caciques que a maré começou a ficar “caroçuda” e elementos estranhos ao (bom) futebol passaram a interferir nos resultados. E isso já era esperado pelos mais antigos, ou experientes, como manda a regra do politicamente correto. Também foi muito atrevimento um time do interior, hibernando por longos anos, acordar para o futebol de vitórias.

Na realidade, se os meninos do Itabuna chegassem de mansinho, comendo o mingau pelas beiradas, não despertaria tamanha ira dos dominantes, e como na capoeira, ao final, aplicasse um asfixiante, uma ponteira, deixando o adversário estendido ao chão. Às vezes acredito que a culpa tenha sido do técnico que orientou “mal” os seus atletas incitando-os a ganhar todos os jogos.

O Itabuna pensava que era quem? A seleção amadora de Itabuna da década de 1960, que vencia e convencia, não se importando nem mesmo com os árbitros? Pois é, esse tempo já passou e hoje para se formar um time vencedor custa muito dinheiro, depende de investidores, que somente colocam seus recursos para colher os resultados, de forma imediata. É toma lá, dá cá.

Não sou um especialista em futebol, apesar de ter trabalhado na comunicação esportiva. Muito menos do Itabuna, do qual sou apenas fiel torcedor. Mesmo de fora, acompanhei como pude a formação do time, modesto mas aguerrido. Sempre estava atento aos jogos, acompanhando em canais no You Tube. A cada jogo analisava a coragem da diretoria em formar uma equipe após 12 anos fora do campeonato baiano da série A.

Barreiras por toda parte, a começar pela falta de estádio para treinar e mandar seus jogos junto de sua torcida, sem falar na contratação da comissão técnica e jogadores e a manutenção de toda a estrutura. Pensando nisso, vinha à memória o Itabuna Esporte Clube mantido pelos cacauicultores, pecuaristas, industriais e comerciantes, isso há cinco décadas. Os tempos são outros.

Em cada jogo que assistia me vinha à mente os jogadores do passado e os atuais, cuja comparação não pode mais ser feita, haja vista – também – a qualidade dos adversários. E me perguntava se não seriam válidas nos treinos as presenças de jogadores como Carlos Riela, para mostrar como desarmava o adversário e construía uma jogada; e de Bel (Abelardo Moreira), que posicionado frente a nossa defesa dava um passe certeiro na cabeça do centroavante, posicionado na área adversária, para finalizar com um gol.

Mas tudo tem seu tempo, os mais experientes param pela ação dos anos e aos novos ficam a obrigação de fazer um futebol melhor, dar a alegria aos torcedores sempre que colocar a bola no fundo das redes adversárias. Se pensamos assim para os que se posicionam dentro de campo, esperamos que comportamento igual seja destinado aos que mandam no futebol. Ou será uma simples utopia?

Parabéns ao Itabuna que continua no campeonato baiano da série A, disputará o campeonato brasileiro da série D e ainda participará da Copa Brasil. Mas como o calendário cheio é em 2024, esperemos que a diretoria continue no esforço e consiga manter uma equipe aguerrida e preparada para derrotar as jogadas extracampo que, por certo, teimarão em dar o ar da graça (totalmente sem graça) nos próximos certames.

*Radialista, jornalista e advogado

sábado, 18 de março de 2023

A Cronica Futebolística de Walmir Rosário

 

AMERICANO, UM CRAQUE QUE NÃO GOSTAVA DE FUTEBOL

Americano, peça importante do grande Itabuna de 1970

Por Walmir Rosário*

O itajuipense Arnaldo Santos de Carvalho detestava futebol. Ele gostava mesmo era de basquetebol e voleibol. O problema era que todos os seus amigos ilheenses viviam o futebol e Arnaldo teve que tomar uma decisão: Ou se isolaria dos amigos ou aderiria ao famoso esporte bretão, que encantou e encanta os brasileiros. Resultado, optou pelo futebol, ao qual se dedicou por longos 30 anos, como jogador e treinador.

Você não se lembra do Arnaldo? Claro que conhece! Arnaldo era quando detestava o esporte querido dos brasileiros. Mas, com certeza, quando falamos de futebol em Ilhéus, Itabuna e até Salvador, todos lembrarão de Americano, zagueiro e meio-campista. Fora das quatro linhas foi treinador do Ilhéus Esporte Clube, já num período conturbado do futebol profissional do Sul da Bahia.

Um craque que reunia todas as boas qualidades técnicas e físicas. Esse era o Americano, que realizava seu trabalho com bastante seriedade, daí ser considerado um líder nato nos clubes pelos quais passou. Desde cedo não gostava muito de treinar, o que passou a fazer com afinco para melhorar seu rendimento dentro de campo e demostrar aos colegas a necessidade de se tornar um profissional exemplar.

Americano começou a jogar pelo Flamengo de Ilhéus em 1961, considerado o período mais florescente do futebol, época em que o Brasil se tornou bicampeão mundial, o que não era diferente na região, principalmente em Itabuna e Ilhéus. Também passou pelo Colo-Colo de Ilhéus, Itabuna Esporte Clube e Vitória de Salvador. Como jogador profissional, Americano foi pretendido por clubes do Rio de Janeiro e São Paulo, porém nunca se interessou em ter o futebol profissional como primeira atividade.

Em suas frequentes análises, Americano comentava que com a recessão no futebol nacional, houve um desgaste muito grande dos dirigentes, agravada, ainda mais, com a crise financeira, impedindo a descoberta de novos valores. Ele citava como exemplo o futebol de Ilhéus, que apesar de possuir times era um mercado pequeno para a garantir a sobrevivência de três equipes profissionais.

Em suas críticas, creditava essa derrocada à insistência do presidente da Federação Bahiana de Futebol, Carlos Alberto Andrade, que encantava com sua poderosa lábia os dirigentes do Sul da Bahia. E assim os cartolas de Ilhéus e Itabuna resolveram remar contra a maré. Ele mesmo era contra, porém foi voto vencido, pois defendia um único clube, e que poderia se estabelecer como uma força da cidade praiana.

Americano sempre defendeu a profissionalização do futebol do interior, mas era contra a realizada sem critérios ou infraestrutura e que provocou uma verdadeira “chacina de valores”, impedindo o aparecimento de novos craques. Ele dizia que a partir do profissionalismo, ninguém mais se interessava pelo futebol amador. E era justamente o futebol amador quem formava e alimentava as equipes profissionais.

E Americano lembra que ainda garoto todos de sua idade se espelhavam em craques como Pelé, Garrincha ou Didi, em nível nacional, ao mesmo tempo em que tinham como ídolos os jogadores de sua cidade. Ele mesmo citava os seus, a exemplo de ‘Pelé Cotó’, Esquerdinha (Eduardo) ou Bebeto, que foi seu grande professor. E hoje os garotos vão se espelhar em quem?”, perguntava.

No Itabuna Esporte Clube, Americano foi um jogador preponderante dentro e fora de campo, tanto nas boas fases financeiras do clube, como nas piores. Sempre exercia sua liderança e encontravam o caminho para seguir em frente. Nos tempos das “vacas magras” de 1970, era um verdadeiro paredão do Itabuna Esporte Clube, que apesar das situações adversas se tornou vice-campeão baiano.

Como treinador, Americano defendeu o Ilhéus Atlético Clube, nos anos de 1990 e 91, época em que revelou uma série de craques que ele considera uma nova geração de valores, como Cenildo, Nazaré, Cocada, Bico de Pato, Solteiro, José Alberto, dentre outros. E esses jogadores vieram da escolinha do professor Manoel Renato, um obstinado profissional que mudou a realidade social e esportiva em Ilhéus.

E Americano nunca deixou de comentar que sua passagem como treinador do Ilhéus Atlético Clube trouxe recordações boas e amargas. As boas ele destaca a geração de novos valores e, as amargas a atitude dos dirigentes da Federação Bahiana de Futebol, que ludibriou os ilheenses, acabando com todos os estímulos aos amantes dos jogadores e do bom futebol.

E Americano ressalta o nível de dirigentes daquela época, a exemplo de Francisco Rebouças, do Itabuna; e Gutemberg Cruz, do Ilhéus. E ele ainda sonhava que poderiam ser revelados craques como Ivo Babá, Vilson Longo, Manequinha, Deco ou Bebeto. Arnaldo Santos de Carvalho, Americano, craque de bola, violonista clássico, funcionário do Detran e advogado, nasceu em 18 de julho de 1934, em Itajuípe e morreu em 03 de outubro de 2010, em Itabuna.

Deixou muitas saudades!

*Radialista, jornalista e advogado


sexta-feira, 10 de março de 2023

A Cronica de Walmir Rosário - CINTO DE SEGURANÇA, PROJETO DE INUTILIDADE

 

CINTO DE SEGURANÇA, PROJETO DE INUTILIDADE

Ônibus lotado, no desenho de Marina R. Machado, de 12 anos 

Por Walmir Rosário*

O que deveria ser um tema sério é tratado como vulgaridade, futilidade, desrespeito à segurança e a dignidade humana. E o palco é a Câmara Federal, em Brasília. Pasmem, o projeto mistura alhos com bugalhos e tentaria dar segurança a uma parte dos milhares de passageiros de ônibus urbanos, relegando outra parte ao Deus dará, ao infortúnio que lhes cabe no latifúndio do injusto transporte público brasileiro.

Se por um lado, a lei diz que é obrigatório o uso de cintos de segurança em veículos, mas, porém, todavia, contudo, entretanto, uma exceção foi colocada para salvar a legislação diz: onde se é permitido viajar em pé, ou seja, nos malfadados ônibus urbanos, pode, está tudo liberado. E a questão segurança desce esgoto abaixo, num confronto à normal constitucional que declara igualdade entre os seres humanos em toda a nossa pátria.

E a justificativa é a mais estapafúrdia, explicando que se não for permitido passageiros em pé, o serviço seria caríssimo e impraticável, pois o número de veículos passaria para mais que o dobro. Pior, ainda, é que o motorista não poderia dar partida no veículo antes que o passageiro estivesse devidamente sentado. Também, o passageiro ao pedir para descer no ponto, somente poderia sair do assento, após a parada e a consequente retirada do cinto de segurança. Uma pérola, beira ao caos organizado.

Mas agora um milagroso projeto de lei pretende implantar a obrigatoriedade do cinto de segurança, mesmo nos ônibus que permitem passageiros em pé. Se lhes parece estranho, vejam a justificativa do parlamentar José Nelto (PP/GO), no projeto de lei 2515/2022, para alterar o Código de Trânsito Brasileiro, estabelecendo o cinto de segurança como equipamento obrigatório nos assentos preferenciais, de passageiros, do motorista e cobrador dos veículos de transportes coletivos.

A justificativa do deputado goiano é que, quando houver assentos disponíveis dentro desse meio de locomoção é de suma importância que haja cinto de segurança, já os demais que não obtiverem uma cadeira dentro do transporte coletivo, finalizarão o percurso em pé como já é de costume. Vale salientar que não há motivo para que o cobrador e o motorista não usem cinto de segurança, tendo em vista que tal medida assegurará um possível acidente de trabalho.

Em razão do já exposto, continua a justificativa: “tal medida beneficiará idosos que já não possuem tanto preparo e força física necessária para utilizar esse tipo de meio de locomoção, como também auxiliará mães e suas respectivas crianças que dependem desse tipo de transporte para se locomover”. Aos que costumeiramente utilizam o transporte público de passageiros, resta uma pergunta: O deputado já andou em um desses ônibus?

Acredito que não, do contrário não continuaria a justificativa com outras baboseiras, tais como a que se segue: “Dessa forma, a presente proposição tem como finalidade instituir tal acessório de enorme e comprovada importância, sem nenhum prejuízo aos passageiros, levando em consideração que aqueles que não conseguirem se assentar, finalizarem a corrida em pé como já feito cotidianamente”. Melhor seria ter o desconhecido parlamentar permanecer calado. Ganharíamos muito com o silêncio do deputado.

Pelo exposto no absurdo projeto, realmente o parlamentar não tem ou teve, bem como seus assessores, a menor intimidade com um ônibus urbano, notadamente nos horários de maior movimento. Numa pegou uma fila num ponto ou terminal, jamais viu passageiros viajando pendurados nas portas (abertas, por sinal), muito menos o que acontece quando o motorista aplica um freio de arrumação.

Nem por sonho sabe, ou por ouvir dizer, que os assentos preferenciais foram selecionados nos ônibus para o uso dos mais expertos, dos que chegam mais cedo e se abancam sem qualquer respeito ao que diz a lei, e muito menos aos idosos, gestantes e outros que deveriam ser beneficiados. Mesmo que os que por direito reclamem seus lugares, os infratores não dão a mínima, pois fingem sono profundo, embora não seja o dos justos.

Não creio que o minúsculo e inexpressivo projeto consiga chegar ao plenário, mas será incluído no currículo do inusitado parlamentar e divulgado pela imprensa e campanhas políticas, como prova de seu suado trabalho. Já os que sacolejam diariamente nos ônibus terão melhor sorte, pois se já estão excluídos sem o projeto de lei do deputado José Nelto, continuarão sem causar nenhuma dó ou piedade aos nossos ilustres parlamentares.

Pegando uma carona nesse inexpressivo projeto, relato aqui o acontecido comigo dias recuados, ao embarcar num ônibus da Rota em Feira de Santana com destino a Senhor do Bonfim. Para comprar a passagem, tive que apresentar uma série de documentos e cartão de crédito. No embarque, só faltaram me exigir a certidão de batismo e de óbito, mas, enfim viajei.

Tratamento igual não foi dado aos que paravam o ônibus no meio da rodovia e embarcavam apenas pagando, em reais, moeda nacional, sem as outras exigências a mim cobradas. Lotação esgotada nas poltronas, os viajantes em pé não era alertados pelo motorista – ao contrário de nós – pela falta de uso do cinto de segurança e ainda se recostavam em nossos assentos, alguns sentando-se nos braços das poltronas.

Faltavam educação e fiscalização. E ninguém, sequer, cobrou a segurança. Fineza que conhecer o deputado José Nelto, que é autor de diversos projetos, aconselhá-lo a desistir desse infrutífera empreitada. Quem sabe, mudar o foco para que o brasileiro possa ter um transporte digno pode até ter sido uma boa intenção, o que seria uma proposição relevante, o que não é o caso em questão.

*Radialista, jornalista e advogado

sexta-feira, 3 de março de 2023

A Cronica de Walmir Rosário

 

APÓS 10 ANOS CANAVIEIRAS QUEBRA O TABU EM BELMONTE

Mesmo desfalcada do goleiro Canavieiras ganha o jogo

Por Walmir Rosário*

Imaginem o clima de rivalidade no futebol entre duas cidades-irmãs (ou mãe e filha, como queiram), a exemplo de Itabuna e Ilhéus, ou entre dois países “hermanos”, do tipo Brasil e Argentina...não queiram nem pensar! Pois aqui no Sul da Bahia, tem jogos mais acirrados quando os contendores são os selecionados de Canavieiras e Belmonte, cidades que têm muitas afinidades, digo mais, parentescos.

Se a partida for disputada em Belmonte, no estádio Orlando Paternostro, então, o buraco é mais embaixo, como dizem na gíria. E as dificuldades para esse jogo envolvem um planejamento diferente, como se os dois times fossem se enfrentar numa guerra. E era! A começar pelos preparativos, que requeriam muito estudo sobre a maré que permitiria viajar tranquilamente pelos canais que cortam o imenso manguezal.

E essa etapa a ser cumprida era por demais importante, pois a maré baixa era uma ameaça de interrupção da viagem e qualquer dos dois poderiam tomar um WO, mesmo que não fosse um jogo valendo pelo campeonato intermunicipal. E explico: caso a maré permitisse, viajariam no mesmo dia do jogo, para evitar as manifestações contrárias da torcida belmontense, conhecida pelo fanatismo. Do contrário, teriam de ir no dia anterior.

Em 1960, como conta o ex-jogador João Xavier, a Seleção de Canavieiras estava há 10 anos sem conseguir vencer o selecionado belmontense. Já era considerado um tabu difícil de ser batido, dito e conhecido como freguês de carteirinha. E nessa condição, os dirigentes de Belmonte convidaram os canavieirenses para disputar uma partida superimportante, que marcaria a reinauguração do Estádio Orlando “Setentão” Paternostro.

Desafio aceito, a Seleção de Canavieiras se prepara para o jogo do século, prometendo quebrar o tabu de uma década de derrotas e empates. E aqui, vale a pena salientar, que belmontenses e canavieirenses são grandes amigos, parentes, desde a fundação das duas cidades, quando por aqui chegaram os portugueses, franceses, italianos e escolheram em qual foz dos rios Pardo ou Jequitinhonha fincariam moradia.

Fora do futebol, os moradores das duas cidades se completavam, mas ao anunciarem uma partida entre eles, o clima esquentava. E uma partida para reinaugurar o importante estádio ficaria na história da cidade. E não era pra menos, seriam lembrados eternamente, com placa de bronze com os nomes de dirigentes, jogadores e o placar vencedor em letras garrafais na placa inauguratória.

E pela qualidade dos seus jogadores, Belmonte tinha direito a sonhar alto. Quem ousaria desafiar uma seleção com os goleiros Padre, Edmílson e Urbano, além Carlos Gama, Carioca, Arcanjo Cara de Osso, que depois jogou no Vitória da Bahia, Sandoval, Herculano, Totônio, Porto Seguro, Diniz, Cabo Jorge, que jogou no Galícia e Ypiranga, Edílson e Lubião? Todos presididos pelo aviador Nena Lapa.

A Seleção de Canavieiras não ficava atrás, pois era formada por craques de primeira, agora reforçada pelo bancário e craque João Xavier, e Bené, um garoto que viria a fazer muito sucesso no Botafogo Carioca com o nome de Canavieira. Foram 15 dias de treinamento tático e físico. Seria agora ou nunca quebrar o tabu de uma década de maus resultados. E os canavieirenses partiriam pro tudo ou nada.

No dia da viagem apareceram no porto grande para pegar a lancha os jogadores Gilvan, Nondas, Leto, Chico, Talminho, Natal, Teotônio, Xavier, Super Coelho, Jorge, Bené (Canavieira), Duzinho, Pequeno, Cavaquinho, Miruca, dentre outros que a memória falha. A primeira baixa apareceu logo no porto, com o goleiro reserva incapacitado para viajar, tudo por conta da farra na noite anterior.

Como não tinham tempo para convocar outro goleiro, tentaram a sorte levando apenas Chico. Sabedores do ponto fraco de Canavieiras, os jogadores de Belmonte não contaram conversa até tirar o goleiro Chico de campo, com uma grande pancada na perna após marcarem um gol. E agora, quem substituiria Chico? E a escolha recaiu sobre o centroavante Cavaquinho, um craque que atuava em qualquer posição, e goleador nato.

Conta João Xavier, que na hora os canavieirenses lembraram do tabu que tanto queriam quebrar e o desespero tomou conta da turma. Mas os jogadores foram se refazendo e aos poucos começaram a dominar o jogo. Os belmontenses ainda não conheciam o garoto Bené, que logo marcou um gol, seguido de Miruca. E o placar do estádio Orlando Paternostro marcava 2X1, a primeira derrota em 10 anos. Justamente para Canavieiras.

E os torcedores e jogadores de Belmonte pressionaram os adversários até quando o árbitro, finalmente, deu o espetáculo por encerrado, para o desespero dos belmontenses, desacostumados a perder uma partida para Canavieiras há longos 10 anos. Na volta, uma festa e tanta na lancha, em que até o garoto Bené entrou na comemoração, bebendo e fumando pela primeira vez.

Pelo serviço de rádio do aeroporto, o resultado do jogo já era conhecido em Canavieiras e sua torcida foi ao porto grande recepcionar os jogadores. E a festa entrou noite adentro e somente terminou com os primeiros raios do sol. O tabu foi quebrado na casa do adversário e justamente em tarde de gala na reinauguração do estádio, orgulho dos belmontenses. E em Belmonte nunca mais se falou desse jogo.

*Radialista, jornalista e advogado