sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

BECO DO FUXICO, UMA “BOMBA” PRESTES A EXPLODIR

 

BECO DO FUXICO, UMA “BOMBA” PRESTES A EXPLODIR

 

Fuxicaria, do zap da Confraria do Alto Beco do Fuxico

Por Walmir Rosário*

Como prevíamos, a frequência do Beco do Fuxico vem aumentando assustadoramente. A cada sábado, novos frequentadores chegam aos magotes, deixando perplexos os participantes dos grupos assíduos do ABC da Noite e Fuxicaria. Desses, pelos que deixam a transparecer, muitos neófitos e que jamais chegarão a noviços, uns poucos alunos repetentes do Caboclo Alencar em busca de renovar suas matrículas.

Pelas fotos que recebo no grupo de WhatsApp da Confraria do Alto Beco do Fuxico, muitas das caras que me são conhecidas são totalmente alheias às obrigações de sábado num beco que aloja, há dezenas de anos, o que existe na mais fina-flor da boemia itabunense. Deixo aqui o necessário reparo que até protestantes, que detestam as bebidas alcoólicas, aparecem nas fotos, todos eles se comportando como peixe fora d’água.

Nunca conversa rápida com o oftalmologista Wandick Rosa, nossas dúvidas foram decifradas com o olhar atento de médico especializado em enxergar bem. Olho de Lince, diria o saudoso amigo Iram Marques, o famoso Cacifão, este expert nas artes do Beco do Fuxico e da política. Pois, bem, ao revermos os arquivos de fotos, algumas figurinhas carimbadas foram detectadas.

Foi a partir daí que descobrimos as datas das fotos, todas com mais frequência em anos pares e algumas incursões nos meses que finalizam os anos ímpares. Aí ficou fácil, são os políticos – pré-candidatos – e seus cabos eleitorais, atualmente renomeados pomposamente de assessores. Ao chegarem ao Beco do Fuxico a recepção não poderia ser diferente, com os cumprimentos de praxe:

– Mas rapaz, há quanto tempo, por onde tem andado? Seja bem-vindo, não faça cerimônia, pega uma cadeira e se sente –.

Diante de um convite fagueiro como esse muitos não resistem, e sem qualquer cerimônia tomam assento numa mesa, enquanto outros revelam sua condição de abstêmio, explicando que não é nada com a saúde, que se encontra boa, tinindo como disse o médico no último checape. Mas o problema é de ordem religiosa, que abomina o álcool e outros bons prazeres da vida.

Até aí, tudo bem. O problema maior reside nos assessores do pré-candidatos, aqueles que somente aparecem de dois em dois anos, nos meses em que começam as campanhas eleitorais. Os pré-candidatos ditos de esquerda são os mais exaltados e sequer olham para as marcas de cerveja que os anfitriões das mesas estão bebendo e pedem logo a bebida de suas preferências: a Heineken, aquela que ostenta uma estrela vermelha na garrafa.

E nesse momento os que têm simpatia ou militam nos partidos de direita, se entreolham assustados, desconversam sobre a preferência dos visitantes e exaltam as qualidades da Stella Artois, cujo paladar apreciam. E as discordâncias vão pululando entre os participantes daquela mesa e as que os cercam. Um amigo meu que não é afeito às brigas políticas me confidenciou que, por vezes, coloca um rótulo de um refrigerante tapando a estrela vermelha da Heineken, para evitar novos problemas, mas não deu certo.

Meu amigo e colega Pedro Carlos Nunes de Almeida (Pepê), que há décadas possui banca advocatícia no Beco do Fuxico, portanto, conhecedor de cada palmo daquele chão, me revelou apreensivo:

– Rosário, o Beco do Fuxico está se transformando numa bomba atômica prestes a explodir! Imagine na mesma mesa esquerda e direita tentando passar o Brasil a limpo? Não estou vendo com bons olhos essa aproximação, devido ao temperamento explosivo de alguns militantes, ainda mais exaltados pelas deliciosas batidas do Caboclo Alencar e as cervejas do Fuxicaria – explicou sua temeridade o amigo Pepê.

Ainda bem que José d’Almeida Senna – hoje com cadeira cativa nos pubs soteropolitanos da Pituba – raramente frequenta o Beco do Fuxico, pois poderia, a qualquer momento, tocar fogo no estopim e incendiar o Beco e botar alguns esquerdistas para correr, após seu famoso grito de guerra. Bastariam uns três gritos de “vão tomar n... c… car…”, para colocar ordem no lugar, sem maiores delongas.

Mas meu amigo Wandick Rosa, como um homem de ciência, portanto, grande observador, apesar de se mostrar receoso com os diferentes – politicamente falando – juntos, me conta um fato digno de nos manter calmos, longe de ser o Beco do Fuxico uma Faixa de Gaza. Pelo que viu, com seus próprios olhos, lá para as tantas, a direita sorvia grandes goles de Heineken, sem se importar com a estrela vermelha, enquanto a esquerda deixava de lado os defeitos da cerveja Stella Artois, a preferida dos imperialistas.

Mas lá no Beco do Fuxico é assim mesmo, alguns aparecem em dias festivos somente para gozarem dos seus 15 minutos de fama, mesmo que não pertençam à fauna local. Já as batidas elaboradas pelo alquimista Caboclo Alencar não passou por nenhum questionamento quanto à preferência. Seriam as batidas do ABC da Noite, de centro, que todos as querem bem coladinhas neles? E ainda dizem que toda a unanimidade é burra...

*Radialista, jornalista e advogado


quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

A Cronica de Walmir Rosário - Direto de Canavieiras

 

A GUERRA QUÍMICA NA RIVALIDADE ENTRE ILHÉUS E ITABUNA

O Viaduto Catalão facilitava o ataque pelos ilheenses

Por Walmir Rosário*

Dois fatos relevantes sobre a rivalidade no futebol entre Ilhéus e Itabuna ficaram marcados na memória do diretor do Banco Econômico da Bahia, Carlos Botelho: O primeiro foi o acidente sofrido por Clóvis Nunes de Aquino, centroavante da seleção de Itabuna, que apesar de reserva de Juca Alfaiate, que era mais impetuoso, e em determinadas partidas era escolhido em lugar do titular, considerado mais técnico.

E num desses jogos, no primeiro tempo, a seleção de Ilhéus ganhava, em casa, por 2X0, quando no segundo tempo o técnico Costa e Silva (à época gerente das Casas Pernambucanas, em Itabuna) tirou o trio atacante de Itabuna – Lubião, Juca Alfaiate e Macaquinho – e substituiu-o pelo trio atacante reserva – Mil e Quinhentos, Clóvis Aquino e Lameu – com o intuito de virar o placar.

Com apenas 15 minutos do jogo reiniciado, o Itabuna já empatava em dois a dois, com dois gols de Clóvis. Foi aí que o violento beque da seleção de Ilhéus, Pedro Fateiro, do Fluminense do Pontal, enlouquecido com o “baile” que tomavam, numa jogada eminentemente criminosa, desferiu um pontapé no rosto de Clóvis Aquino, causando fratura no nariz e no maxilar.

A segunda briga no estádio ilheense também foi terrível, no momento em que o itabunense Alberto Santana, ao defender os interesses de Itabuna, ficou sozinho e apanhou bastante dos ilheenses. A briga, que iniciou na arquibancada do Estádio Mário Pessoa, só terminou no meio do campo, tanto que o jogo não teve continuidade. Nesta partida, a torcida do Itabuna foi – mais uma vez – literalmente massacrada.

Os torcedores de Itabuna não deram o braço a torcer e prepararam a revanche, desta vez em um novo jogo entre os times das duas cidades, realizado no campo da Desportiva itabunense. Com antecedência, um prático farmacêutico de nome Andrade, que trabalhava na Farmácia Caridade, do Dr. Nilo de Santana, preparou umas “laranjinhas” (um tipo de bola de gude revestida de parafina) contendo um produto químico devastador.

Após o jogo, assim que os ilheenses embarcam no trem para retornar a Ilhéus, diversas pessoas da torcida itabunense jogaram as tais laranjinhas dentro dos vagões, causando uma fedentina insuportável, além de manchar e rasgar as roupas. No dia seguinte, o Diário de Ilhéus estampava em sua manchete: “Itabuna lança guerra química contra Ilhéus”. Mais uma vez as populações das duas cidades ficaram um bom tempo com as relações estremecidas.

Assim que era marcada a próxima partida, as duas torcidas se preparavam para dar continuidade à batalha campal nos estádios de futebol das duas cidades. Nos dias em que antecediam as partidas, os grupos se encarregavam de preparar “as armas” para irem à guerra. Os próprios meios de comunicação das duas cidades – à época os jornais – promoviam o acirramento dos torcedores, de acordo com os acontecimentos do último jogo.

Nessas batalhas Ilhéus sempre levava a melhor por ter pontos de passagem na estrada que facilitavam o ataque, como os morros e barrancos. Com a inauguração do Viaduto Catalão – em 31-03-1955 –, os ilheenses ganharam um local privilegiado para atirar pedras, paus e tudo que fosse possível nos itabunenses. E a desvantagem dos itabunenses era gritante, pois grande parte da torcida viajava em carrocerias dos caminhões, portanto desprotegida.

Em Itabuna, apenas dois pontos favoreciam os torcedores locais: na ponte em frente a reformadora de pneus Bendix, no bairro de Fátima, e os paredões do morro do Dr. Caetano, no Alto Mirante. Os ataques aos torcedores adversários se davam na entrada e saída das duas cidades, não importando qual o resultado do jogo. A palavra de ordem era promover a vingança do jogo anterior.

Em tempos mais recentes, no início da década de 1960, o zagueiro Itajaí, nascido em Itabuna, teve a oportunidade de jogar pelas seleções de Ilhéus e Itabuna. Era um zagueiro vigoroso e por isso, contrariava as duas torcidas. Em algumas das várias partidas entre as representações das duas cidades, torcedores incentivavam que os adversários quebrassem a perna de Itajaí, considerado “vira folha” pelos adversários.

Foi nesse período que as contendas entre os times de Ilhéus e Itabuna, notadamente as seleções, passaram a ser consideradas inimigas viscerais, e como os itabunenses sempre venciam, os ataques da população praiana eram mais intensos. Devido a esse motivo, além de serem nomeados mutuamente de papa caranguejo e papa jaca, os ilheenses também passarem a ser chamados de cubanos, numa alusão à Cuba de Fidel Castro.

Se o “pau comia” fora dos campos de futebol, nas arquibancadas e dentro das quatro linhas não eram diferente. Apesar dos ilheenses terem bons craques, era difícil vencer os itabunenses, que rivalizavam em qualidade de atletas e jogavam pelo resultado, saindo vencedores nas guerras dentro das quatro linhas. Historicamente, os resultados podem ser contados pelo número de campeonatos vencidos pela Seleção Amadora de Itabuna, que chegou ao hexacampeonato em anos seguidos.

*Radialista, jornalista e advogado

quinta-feira, 14 de dezembro de 2023

A NABABESCA FESTA DO DENDÊ EM CANAVIEIRAS

 

A NABABESCA FESTA DO DENDÊ EM CANAVIEIRAS

A Prefeitura de Canavieiras foi uma excelente anfitriã 

Por Walmir Rosário*

O Brasil passou por grandes mudanças com a eleição de Tancredo Neves e a chegada de José Sarney à Presidência da República. E o PMDB começa a atuar para impor o ideário do partido conforme vinha prometendo por anos a fio. A proposta era transferir os recursos do Estado Brasileiro para a promoção do desenvolvimento. E as torneiras financeiras de Brasília começaram a jorrar com força total.

Eleito com uma expressiva votação, o médico ilheense Jorge Viana se mostra um deputado federal atuante e, de forma incansável, consegue transferir recursos federais para as cidades do sul da Bahia. Os parcos recursos para custeio e investimentos de antes mudaram da água para o vinho e os mais diversos setores da economia começaram a receber dinheiro para fazer a roda da economia girar.

E a ação do deputado federal peemedebista Jorge Viana de destrancar o cofre federal se transformou numa fertilização constante para e economia do agro, principalmente a cacauicultura e a dendeicultura, dentre outras. Esforços e recursos não faltariam para o soerguimento da agricultura. De início, Canavieiras e Una foram contempladas para dar o famoso pontapé na industrialização do dendê.

Na direção da Ceplac, Joaquim Cardozo não media esforços para diminuir o tamanho da instituição e promovia o emagrecimento das atividades, prometendo privilegiar apenas agricultura, transferindo as demais para outros órgãos estatais. E um forte aparato na comunicação para acompanhar as atividades políticas na economia foi implantada, no sentido de mostrar o “novo Brasil”.

E num desses sábados uma grande comitiva do Ministério da Agricultura, capitaneada pelo deputado Jorge Viana e Joaquim Cardozo se deslocam para as cidades de Una e Canavieiras para a solenidade de transferência desses recursos. Com a inflação galopante daquela época não consigo lembrar o valor exato dos recursos, só lembro que era múltiplo de 5 (50, 500,?) nem se eram milhões ou bilhões de cruzados.

Porém minha memória não esquecerá – jamais – as solenidades realizadas para repassar os recursos aos municípios contemplados. Por obra do destino, Tyrone Perrucho exercia a chefia do Núcleo de Comunicação (ex-Dicom) e seu pai Wallace Mutti Perrucho era o atual prefeito de Canavieiras, o anfitrião principal dessa grande festividade que poderia dar uma guinada na cultura do dendê.

E uma efeméride dessa magnitude não poderia passar em branco, deixar de ser realizada com todos os requintes para atender e ressaltar o trabalho dos benfeitores da economia regional, que a partir de então olhavam com bons olhos o antes desprezado sul da Bahia. Seria realizada uma recepção digna das promovidas pelo Itamaraty aos chefes de Estados estrangeiros e seus representantes, sem esquecer os mínimos detalhes.

Para prestar um serviço de primeiro mundo, o jornalista Tyrone Perrucho assessorou o prefeito Wallace Perrucho, contratando a equipe de garçons da Ceplac, comandada pelo maitre Mário, com as recomendações de que deveria ser um serviço perfeito. Outra equipe ficou responsável para decoração do Clube Social, bem ao estilo do Baile da Ilha Fiscal, o último dado pelo Imperador Pedro II, no que se refere ao luxo e ostentação.

No cardápio, somente frutos do mar (o que não era do paladar de Tyrone Perrucho), com ostras gratinadas, de moqueca e cruas, servidas ao azeite português e suco de limão; patinhas de caranguejos a milanesa, a famosíssima cabeça de robalo, que era a mais nova atração da gastronomia canavieirense; moquecas de robalos; polvos e lulas defumados, em vinagrete; mexilhões, lambretas e outras refinadas iguarias da rica costa marinha brasileira.

Não me sai da memória a carta de vinhos e os vários tipos de whisky, como Chivas Regal e Old Parr, todas acima de 12 anos, e cervejas extras. Assim que entramos no clube, uma mesa localizada em frente a saída da cozinha estava reservada para a equipe da comunicação da Ceplac. Deve ter sido escolha pessoal do nosso chefe Tyrone Perrucho, no intuito de privilegiar seus comandados, entre eles, eu.

Confesso que fiquei surpreso com tamanho requinte e sofisticação em Canavieiras, mas não economizei esforços para demonstrar minha elevada satisfação aos anfitriões, que não mediram esforços em receber os visitantes e benfeitores. E como dizem Deus escreve certo por linhas tortas, pois seu Perrucho, como chamávamos Wallace, até pouco tempo era apenas vereador, quem sabe, vice-presidente da Câmara. Ainda bem que se tornou alcaide.

E foi um golpe de sorte, como dizem: O prefeito Boinha Cavalcante, não ia bem na administração e estaria ameaçado de cassação. Porem quis o destino que ele sofresse dois acidentes: vítima de capotamento de veículo na praia e outro ao mergulhar no rio, o que lhe afetou a coluna. Como o seu vice-prefeito Holmes Humberto de Almeida (do então distrito de Santa Luzia) tinha morrido recentemente, o substituto sairia do Legislativo.

E aí Wallace Mutti Perrucho tira a sorte grande, com a desistência do presidente do Legislativo em assumir à Prefeitura, pois reconheceu que não estaria preparado para uma empreitada desta magnitude. Abdicou do cargo de presidente e, por maioria, os vereadores fizeram valer o regulamento, escolhendo e dando posse a Perrucho como presidente da Câmara e, subsequentemente, ao cargo maior do Executivo canavieirense.

Voltando à nababesca recepção, logo após, vozes descontentes da oposição tentaram desqualificar a sublime festa, sobre o pretexto de que o evento teria custado mais do que os recursos transferidos pelo Governo Federal ao município de Canavieiras. Não cheguei a fazer os cálculos, até porque a matemática não é meu forte, mas acredito mesmo que se tratava apenas de uma ação política para tentar desqualificar a qualidade da festa promovida com muito esmero por seu Perrucho.

*Radialista, jornalista e advogado.


quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

A RIVALIDADE ENTRE ILHÉUS E ITABUNA NO FUTEBOL

 

A RIVALIDADE ENTRE ILHÉUS E ITABUNA NO FUTEBOL

Até o trem de ferro foi tomado pelos ilheenses

Por Walmir Rosário*

As relações de amizade entre a população e autoridades de Itabuna e Ilhéus nunca foram das melhores e remontam desde o tempo em que Itabuna era Tabocas, distrito de Ilhéus. A inimizade foi ampliada com a autonomia político-administrativa e se tornou mais acirrada com as disputas futebolísticas entre as equipes das duas cidades, o que perdura até os dias de hoje, sem qualquer prazo para acabar.

No livro “Bahia, Terra, Suor e Sangue; lembrança do passado/História da Região Cacaueira, o autor José Pereira da Costa narra, com pormenores, a guerra travada entre as duas torcidas. Em 1920, jogaram em Ilhéus o Rio Branco Esporte Clube, de Itabuna, contra o Ypiranga Esporte Clube, de Ilhéus, partida que quase se transformara numa tragédia entre as populações das duas cidades.

Toda essa confusão remonta de 10 de maio de 1897, quando Itabuna solicita ao Conselho Administrativo de Ilhéus, através de um memorando, a sua emancipação de Ilhéus. O memorando foi esquecido numa gaveta qualquer e, novamente, em 1906, foi enviado, desta vez ao governador da Província da Bahia, José Marcelino, azedando ainda mais a frágil relação.

De outra feita, em 1907, por ocasião da inauguração do Palácio Paranaguá, Dr. Xavier, genro do fundador de Itabuna, Firmino Alves, fora convidado na qualidade de orador das festividades. No discurso, prometeu construir prédio ainda melhor de que o Paranaguá para a administração de Itabuna. Resultado, o orador foi apedrejado e teve que voltar para Itabuna escondido.

Mas voltando ao tema que nos interessa, em 1920, para a peleja entre o Rio Branco (Itabuna) e o Ypiranga (Ilhéus), a diretoria do time itabunense fretou um trem especial com 20 classes para atender aos torcedores ávidos para assistir à partida. No dia, saíram bem cedo com destino a Ilhéus, acompanhados da Filarmônica Minerva. Tinha tudo para ser uma grande festa de congraçamento entre as duas cidades.

Entretanto, o jogador João Rego, do Rio Branco, logo após de ter feito o primeiro gol e o único da partida, sofreu uma agressão do filho do Dr. Soares Lopes, e teve o nariz quebrado. Jogo paralisado e início de briga entre as duas torcidas. Para cessar o grande tumulto, pessoas das duas cidades, pediram paz, embora alguns ilheenses passassem a jogar água quente nos itabunenses.

Não bastasse a briga em campo, pessoas influentes pressionaram a direção do Hotel Coelho para que fechasse as portas, não permitindo, sequer, que os jogadores pegassem suas roupas. Como a direção da estrada de ferro era de Ilhéus, tampouco permitiu que o trem fretado fosse liberado para retornar a Itabuna. Por onde passavam, laranjas podres, cebolas, ovos e outros objetos eram atirados nos itabunenses.

Após muitas discussões e promessas de morte, enfim, conseguem o compromisso para a liberação do trem, puxado pela máquina de número 12 e empurrada pela de nº 01 para subir com as 20 classes na serra da Baleia. Antes, porém, o trem parou, e para surpresa de todos, os maquinistas tinham sumido. Armaram uma emboscada para deixar os itabunenses no meio da estrada.

Diante do desespero, eis que surge um cidadão chamado Belmiro, que se encontrava em Itabuna a passeio e viera assistir ao jogo, e se apresenta como maquinista. E Belmiro conduz a máquina e os passageiros são e salvos a Itabuna, chegando por volta das 4 da manhã. Mas apesar das agressões sofridas pela grande comitiva de Itabuna, o jogo que não terminou estava com o placar de Rio Branco 1X0 Ypiranga, o que valeu para “lavar a alma” dos itabunenses.

Pelo que se sabe, esta foi a primeira das guerras no futebol entre os papas caranguejos e papas jacas que se tem notícia. Mais não foi a única. A cada jogo entre os times ou seleções das duas cidades os torcedores se incumbiam de recepcionar a torcida alheia, se armando com pedras, paus e o que mais lhe aparecia às vistas. Bastava escolher um local em que os caminhões passassem devagar para iniciar a artilharia.

E esse espírito beligerante permaneceu por muito tempo, e cada torcida culpava o adversário pelo início da animosidade, que se transformou em grandes confrontos. Com o início do Campeonato Intermunicipal de Amadores da Bahia, as batalhas campais se perpetuaram, chegando à profissionalização dos times de futebol. Somente a partir de 1980 é que as torcidas de Ilhéus e Itabuna selaram um armistício e a paz voltou a reinar nos jogos de futebol entre as duas cidades.

*Radialista, jornalista e advogado


quarta-feira, 6 de dezembro de 2023

OS TABULEIROS DE MACEIÓ: OS SOLOS, AS CAMADAS E O CAOS AMBIENTAL

 

OS TABULEIROS DE MACEIÓ: OS SOLOS, AS CAMADAS E O CAOS AMBIENTAL

 


Por Luiz Ferreira da Silva

Os tabuleiros se originam do terciário – formação barreiras, cuja litologia é formada por arenitos conglomerados, camadas e lentes de argila, arenitos não consolidados e lentes de seixos, conforme meu colega Augusto Pedreira (im), estudioso em geologia de áreas sedimentares.

Em certos trechos do litoral, esses sedimentos – esculpidos em mesa – são cortados por falésias abruptas, como acontece em Porto Seguro (BA) e na Lagoa Azeda/AL, além de outros locais do Rio Grande do Norte à Macaé/RJ.

Trata-se, pois, de materiais retrabalhados sobre os quais sob a ação dos fatores de formação do solo (clima, relevo e a biosfera) formam os solos identificados com a maior ou menor ação de um deles ou combinada.

O autor estudou perfis de solos em topos sequenciais, bem como camadas litológicas até 30 metros de profundidade, em corte de estrada, com vistas a detectar as variações do solo com a posição topográfica (carreamento) e com a posição do sedimento (estratificação cruzada), no intuito de verificar a interação geoecológica na formação dos perfis.

Em razão da natureza físico-química do material de origem, os solos são profundos, pobres em nutrientes, carentes em minerais primários e de baixa retenção de água. Argila de baixa atividade coloidal; dominância de sesquióxidos de ferro e alumínio.

Pois bem, isso é o que se pode ver, apalpar e sentir em trincheiras. Ou seja, os horizontes do solo, de 0 a 200 cm. O mundo do pedólogo, como eu.

Mas as camadas para baixo também lhe interessa, sobretudo os depósitos de água, através de análises de camadas profundas dotadas de areias grossas, contíguas aos argilitos e/ou folhelhos.

Essa estratigrafia é variável e, no caso de Maceió/AL possui uma camada de acumulação de sal (Figura 1), oriunda da evaporação da água salgada marinha, em tempos do plioceno recente. Uma riqueza para a indústria química.


Fig. 1. Estratigrafia e retirada do sal pela Brasken, 

(Poliana Casemiro, g105/12/2023).

É muito comum a perfuração de poços, explorando camadas acumuladoras de água, geralmente situadas a uma profundidade de 80 metros. Neste caso, é preciso se controlar a vasão retirada, utilizando com parcimônia, a fim não desequilibrar o sistema hídrico.

Há casos, ao se retirar excessivamente, o repositório baixar a um ponto tal que, através do lençol freático, o mar penetrar, salinizar e reduzir a qualidade da água, como aconteceu em zonas concentradas desses poços nos tabuleiros de Maceió/Al.

A Natureza nos dá, mas exige respeito às suas Leis. Nunca esquecer disso!

Esse introito até longo é para tentar entender a catástrofe ecológica acontecida em diversos bairros da capital alagoana, ocasionando danos irreparáveis a uma população de mais de 50 mil habitantes, mas não suficientes para sensibilizar o poder público.

Durante décadas, a Braskem minerou o sal-gema, explorando a camada de sais, desrespeitando regras ecológicas, sobretudo, referentes à manutenção do equilíbrio estratigráfico da formação geológica, aqui descrita.

É muito simples, para o leitor entender, de modo sucinto e sem muito “revorteio”. Imaginemos o gostoso bolo de rolo (Figura 2) que os pernambucanos inventaram para deleite de nós todos.

Fig. 2. Bolo de rolo/rocambole com diversas camadas.


Com um garfo, um abelhudo vai cutucando uma camada que mais lhe atrai no interior do bolo. Se pouca coisa, desinforma o bolo, mas sem muitas consequências. Mas ele não se contenta e manda ver na sua gula por doces. O que acontece? O bolo se desmorona.

A Braskem no seu imediatismo e afã de ganhos sem comedimentos, deu uma do nosso glutão, extraindo o sal de modo predatório, ocasionado o desequilíbrio das camadas, afetando o chão que as recobre.

O buraco que apareceu neste ano de 2023 teve um benefício: – lembrar ao poder público e à sociedade, nos seus diversos segmentos, um crime que vem lá de trás, impune na magnitude da agressão ambiental.

Essa celeuma, esse corre-corre de hoje com a mídia divulgando inverdades e os políticos se apiedando dos pobres, talvez seja em razão das próximas eleições de 2024.

A Natureza, em sua sabedoria, a tudo assiste e se lamenta em ter agido com firmeza, como sempre faz ao ter suas Leis contrariadas. (Maceió, Al, 05/12/2.023)

Pesquisador aposentado/Solos Tropicais, CEPLAC/BA.

luizferreira1937@gmail.com