Por tanto, comemoramos hoje os 50 anos da volta do nosso Amado Jorge a conviver com Ilhéus. Com ele e Zélia, vieram João Jorge e Dora, filho e nora; Paloma, filha; James e Luiza, irmão e cunhada; Calazans Neto e Auta Rosa, amigos íntimos.
José Nazal Pacheco Soub
No mês de agosto de 1912, nasceu Jorge Amado. No mês de agosto de 1975, Jorge Amado voltou a conviver com Ilhéus, como amigos de longas data e muitos admiradores. No mês de agosto de 2001, faleceu Jorge Amado.
A importância desse escritor para Ilhéus é imensurável. Penso eu que todas as homenagens já lhe feitas e as que vierem são poucas para devolver a Jorge o quão bem ele fez a nossa terra, tornando-a conhecida em quase todos os confins da Terra. Seu nome está registrado na Rua Jorge Amado, Casa Jorge Amado, Rodovia Jorge Amado, Dia Jorge Amado, Mirante Jorge Amado, Ponte Jorge Amado, Rotary Clube Jorge Amado e Escola Jorge Amado. Parece muito, mas é pouco, se comparado com o número de dezenas de países, milhares de cidades e milhões de leitores que tiveram conhecimento de que Ilhéus existe e que é uma terra cheia de história, magia, de um povo maravilhoso.
Dentre os romances brotados da mente brilhante do grapiúna Amado, nascido em Itabuna e crescido em Ilhéus, talvez o mais importante e conhecido seja Gabriela, Cravo e Canela, lançado em 1958, quando o Brasil vivia os anos dourados do governo de Juscelino Kubitscheck, mas com o cacau atravessando momentos de crise, resultando na criação da CEPLAC. O romance caiu como uma bomba, causando grande frisson entre a sociedade ilheuense, que tentava identificar quem seria cada personagem do livro com alguém da cidade.
Depois do sucesso de Gabriela, Jorge Amado e Zélia Gattai visitaram Ilhéus em 1960, trazendo o casal Simone de Beauvoir e Jean Paul Sartre para conhecer nossa cidade. Fizeram visita ao porto em construção, uma fazenda de cacau, na companhia de Wilson Rosa e Moisés Alves, e encerraram o dia jantando a convite de Sá Barreto, na residência do casal Anacélia e João Diogo Soub, na então Avenida Bahia, Cidade Nova.
Meses após essa visita do casal Amado a Ilhéus, o cronista água-pretense Jorge Emílio Medauar escreveu uma matéria em revista de circulação nacional, muito famosa na época, ligando os personagens do livro a pessoas da vida real, causando um grande alvoroço na conservadora sociedade ilheuense, com muita gente se sentindo ofendida. A partir desse episódio, os dois Jorge passaram a ser malvistos pelas famílias cujos nomes apareceram na matéria. Daí em diante não mais voltaram a Ilhéus.
Em 1974, a Rede Globo decidiu reproduzir a história do gringo Nacib e da retirante Gabriela em novela e, para tanto, deram início às pesquisas, resultando na visita da equipe técnica da emissora à terra do Vesúvio, do Bataclan e do cacau. Lembro-me com segurança do momento em que estiveram na residência de minha avó Esther, na Boa Vista. Foram Walter George Durst, Walter Avancini, Edwaldo Pacote, Kaká e Mário Monteiro, dentre outros. A novela não foi gravada em Ilhéus, e sim numa cidade cenográfica, salvo engano, em Guaratiba, Rio de Janeiro. Reproduziram fielmente o traçado das ruas e das construções, com base em antigas fotos da cidade.
A novela foi ao ar em 1975, com sucesso absoluto de audiência, especialmente em Ilhéus, sendo estrelada por Sonia Braga e Armando Bogus, levando o nome de Ilhéus a todos os recantos do Brasil. Com o advento desse sucesso, Raymundo Pacheco Sá Barretto, o “último dos coronéis”, segundo Jorge Amado, escreveu para o seu amigo, convidando-o para receber homenagens em Ilhéus. Em 29 de julho, Jorge confirmou que aceitaria, sugerindo os três finais de semana de agosto como opção. Ficou acertado para os dias 30 e 31 de agosto.
Por tanto, comemoramos hoje os 50 anos da volta do nosso Amado Jorge a conviver com Ilhéus. Com ele e Zélia, vieram João Jorge e Dora, filho e nora; Paloma, filha; James e Luiza, irmão e cunhada; Calazans Neto e Auta Rosa, amigos íntimos. Vieram também os atores globais: Paulo Gracindo, Sônia Braga, Armando Bogus, Elizabeth Savalla, Marcos Paulo, Ana Maria Magalhães, Fúlvio Stefanini, Rafael de Carvalho, Jorge Cherques. Todos ficaram hospedados no Britânia Hotel.
No sábado (30), houve um jantar no Clube Social de Ilhéus e, no domingo (31), festa com a colocação da placa na Rua Jorge Amado, na Boa Vista (somente depois houve a troca com a rua 28 de junho), além de uma escultura do artista plástico Tatti Moreno, infelizmente destruída por vândalos. Tive a honra e o privilégio de registrar o feliz momento.
De lá para cá, Jorge veio algumas vezes a Ilhéus, a convite oficial ou por iniciativa pessoal, sempre acompanhando Sá Barretto, eu estive junto. Uma das vezes, o casal Zélia e Jorge não pisaram na cidade, pois estavam a bordo do Funchal, seguindo para a Europa. Convidaram Sá Barretto para o café e lá fui eu a reboque. Entramos no navio às 8h e o café se estendeu até às 12h. Foi um momento ímpar, indescritível. O que mais me impressionou foi o tanto de assunto que conversaram, que reviveram. Agradeço a Deus por tanto e por tanta dádiva.
José Nazal Pacheco Soub é fotógrafo, memorialista e autor do livro Minha Ilhéus – Fotografias do Século XX e um pouco de nossa história, lançado pela Via Litterarum.