segunda-feira, 6 de outubro de 2025

Os 37 anos da Constituição de 1988 e a retomada da cidadania

Os 37 anos da Constituição de 1988 e a retomada da cidadania

 

Com toda razão, Ulisses Guimarães referiu-se à Constituição promulgada em 05 de outubro de 1988 (que ora completa 37 anos), como a Constituição Cidadã, que veio para proteger o povo pobre e sofrido do Brasil, massacrado, humilhado e maltratado desde o início da colonização portuguesa.

Como dito por seu relator geral, Bernardo Cabral, os constituintes de 1987/1988 tiveram o cuidado de colocar na parte inicial da Carta Política os princípios fundamentais da República e da garantia dos direitos do homem, inseridos nos artigos 1º, 3º, 5º, 6º e 7º, em respeito ao povo brasileiro, anteriormente sempre colocado na parte final das Constituições.

A Constituição redigida por Ulisses Guimarães, Bernardo Cabral, Luiz Inácio Lula da Silva, Benedita da Silva, Florestan Fernandes, entre tantos outros constituintes, é aquela que veio para reparar o autoritarismo; e, mais do que isto, para dar cidadania a quem jamais a teve, aos que sempre lutaram para sobreviver com um mínimo de dignidade.

É a Constituição de 1988, que, desde o seu preâmbulo, manifesta preocupação em assegurar “o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça, como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social”. Nossa Carta Política também estabelece como princípios fundamentais da República a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho (artigo 1º), constando entre seus objetivos (artigo 3º) “construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos”.O texto constitucional é tão avançado e preocupado com a existência digna do ser humano, que fez questão de ressaltar, no seu artigo 170, que a ordem econômica é fundada na “valorização do trabalho humano e na livre iniciativa”; significa dizer que, de acordo com nossa carta política, o trabalho antecede o capital e está erigido como um valor a ser defendido diante de qualquer outra força econômica.Trata-se de uma constituição avançadíssima para seu tempo (ainda que mutilada por mais de centro e trinta emendas; muitas, a meu sentir, inconstitucionais), que ainda se mantém de pé com seus princípios e direitos fundamentais. Mas é, também, uma Constituição frequentemente sabotada pela classe dominante brasileira, que, antes mesmo de sua promulgação, procurou esvaziá-la, como aconteceu no dia 27 de julho de 1988, quando o ex-presidente José Sarney, com certo tom de ameaça, dirigiu-se aos constituintes, em cadeia nacional de rádio e televisão, para afirmar, ao longo de vinte e oito minutos, que o texto constitucional que estava para ser aprovado “deixaria o país ingovernável”.

Na verdade, a fala de José Sarney, na ocasião, reproduzia os interesses mais atrasados da classe dominante brasileira, que achava que o reconhecimento dos amplos direitos sociais inseridos na Constituição brasileira de 1988 teria um impacto significativo sobre o orçamento geral da União, desde sempre controlado para satisfazer apenas os interesses dos muito ricos e deixando os pobres entregues à própria sorte. É importante lembrar, por exemplo, que, antes da Constituição de 1988 não existia o sistema único de saúde com atendimento universal para todos os brasileiros.

E o presidente Sarney, com o velho e surrado argumento, afirmava que o novo texto constitucional representaria um desencorajamento à produção, induziria o país ao “ócio à produtividade” e “o governo não teria dinheiro para pagar os benefícios sociais aprovados pelo congresso constituinte”; ou seja, a mesma conversa fiada empregada até hoje contra a classe trabalhadora, para justificar o desvio dos recursos arrecadados por meio dos tributos (que recaem sobre o povo) e transferi-los para os muito ricos, que, além de não pagarem efetivamente impostos, vivem da renda proporcionada por taxas de juros exorbitantes, que ampliam cada vez mais o endividamento público.

Naquela oportunidade, Luís Inácio Lula da Silva, então deputado constituinte e líder do Partido dos Trabalhadores na Assembleia Constituinte, assim se manifestou: “A fala do presidente causou três espantos: 1) ver um presidente assustar a nação com o fantasma da ingovernabilidade usando informações imprecisas; 2) ver um presidente reclamar contra liberalidades da constituinte, quando seus líderes não ficaram calados, como votaram a favor dos dispositivos citados; 3) ver um presidente da República, supostamente guardião da independência e da economia do país, ocultar em seu pronunciamento que está forçando a eliminação da propriedade da União sobre o subsolo, a volta concreta do contrato de risco e a preferência à empresa nacional ao Estado” (Folha de São Paulo, 27/07/1988, p. A6).

Infelizmente, a Constituição promulgada em 05/10/1988 não pôde, até os dias de hoje, ser executada na sua plenitude, pois para isso era necessária a eleição imediata de um presidente comprometido com seus ideais avançados, o que, infelizmente, não ocorreu na eleição presidencial de 1989, quando, em decorrência das manipulações típicas da atrasada classe dominante, controladora do país desde a sua fundação, o eleito foi Collor de Mello.

Posteriormente, a mesma classe dominante manobrou para eleger FHC, que retribuiu o favor submetendo incondicionalmente o país à cartilha do neoliberalismo e enfraquecendo o conceito de soberania nacional, por meio de suas emendas constitucionais, aprovadas a partir de 1995, que decretaram o fim do conceito de empresa nacional, acabaram com a proteção da navegação por cabotagem de bandeira nacional, extinguiram o monopólio das telecomunicações e do petróleo (até então detido exclusivamente pela Petrobras) e intensificaram as privatizações do patrimônio público, que extinguiram incontáveis postos de trabalho.

A Constituição de 1988 merecia a eleição de Luís Inácio Lula da Silva em 1989, não apenas para consolidar a redemocratização mas também para levar adiante a implementação dos seus objetivos fundamentais de “construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; e promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Por isso, mais do nunca, é necessário que o presidente Lula seja reeleito em 2026, preferencialmente no primeiro turno. Pois assim, com sua imensa experiência política e crescente maturidade, ele terá a legitimidade para promover os enfrentamentos com a classe dominante do país e retomar os ideais originários da Constituição de 1988. Deste modo, teremos uma base sólida para promover os referendos (conforme previsto no artigo 14 da Constituição) para revogação de todas as mudanças equivocadas impostas ao país, principalmente depois do golpe de 2016, e dar início, finalmente, ao processo da justa distribuição da riqueza produzida por toda a sociedade, como pretendiam os constituintes de 1987/1988, a fim de construir um país efetivamente soberano e desenvolvido para todos os brasileiros.

FONTE: https://www.brasil247.com/blog/os-37-anos-da-constituicao-de-1988-e-a-retomada-da-cidadania

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